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sexta-feira, 31 de julho de 2015

[8334] - O MONTE...


Feliz composição de Luis Lobo do Monte-Cara emoldurado pela silhueta da ilha de S. Vicente...
Foto partilhada por Carlota Alves e José F. Lopes.

[8333] - PATRIMÓNIO, URBANISMO & COMPANHIA...

Liceu velho, Fortim, Eden Park - Revistando o artigo sobre o caos urbanístico no Mindelo: “Uma ilha à deriva”

04 DEZEMBRO 2013. PUBLICADO EM OPINIÃO


 A Câmara Municipal e as autoridades têm a responsabilidade em preservar o património herdado e o legar em boas condições às gerações futuras. Apela-se assim à instauração de uma moratória relativamente a demolição do património, vetando obras que põem em causa a traça original do seu centro e os equilíbrios da cidade no seu todo.
Tendo em conta o actual debate sobre o património, resolvi publicar de novo este artigo de 2011. Liceu Velho, Eden Park, Fortim D’El Rey são os três símbolos materiais da decadência cultural de S. Vicente, um reflexo da decadência estrutural e permanente, resultantes do facto de ter sido votada a 40 anos de abandono pelo Estado de Cabo Verde. ‘Sãocent Cabod na Nada’, os franceses diriam ‘Tout Tout le Camp’ e os anglosaxónicos ‘All Gone With the Wind or Down the Tube’. Pois, S. Vicente uma ilha que investiu fortemente na independência nacional e nela depositou grandes expectativas, acreditando nas promessas políticas de uma nova prosperidade após a longa crise provocada pelo fim da presença inglesa e a glaciação salazarista. Hélas, o filme todos conhecemos: o Estado de Cabo Verde recolheu-se na ilha capital, as elites cabo-verdianas migraram para novos eldorados, a ilha e os mindelenses que ficaram foram entregues ao Deus dará, a cultural, a intelectualidade e a dignidade na ilha aos poucos foram declinando ou desertando. O que vem acontecendo com estes patrimónios mindelenses  é claramente crime de lesa cultura (e começamos a questionar seriamente o que é, na perspectiva do governo e da CMSV, os conceitos de património e património nacional). No caso do Eden Park, este cinema não foi qualquer coisa, era o local cimeiro da cultura mindelense e cabo-verdiana, foi um poderoso instrumento de libertação da condição humana do homem cabo-verdiano no seu sentido amplo e lato, foi aí que depois da escola, das igrejas, e do futebol, o mindelense se educava, via o mundo (ia lá fora cá dentro) e se divertia. Como afirmou Adriano Miranda Lima, ‘esta Casa foi um instrumento de transfusão civilizacional de que beneficiaram todos os cabo-verdianos. Por conseguinte, o problema do Eden Park afecta a sensibilidade e a respeitabilidade de todo o país, e se o governo da Praia o ignora é porque é constituído por pessoas impreparadas e indignas dos cargos que detêm’.
Afinal, Mindelo não viu o seu centro histórico classificado como património nacional desde Janeiro de 2012? O Ministério da Cultura justificou a distinção da “Morada” pelo seu “conjunto arquitectónico de interesse histórico, arqueológico, artístico, científico e social”. Defendeu ainda que “o seu valor justifica a conservação, o restauro e a valorização de um conjunto de imóveis”, por isso a zona histórica será delimitada e protegida.  Mais afirma que‘Com esta classificação de Património Nacional do Centro Histórico do Mindelo feita através da lei de Base do Património Cultural (lei 102/III/90 de 29 de Dezembro), o Estado será obrigado legalmente a preservar e valorizar o seu património cultural. Por outro lado, a Autarquia terá o dever de cuidar desse legado na sua área de jurisdição enquanto aos cidadãos é requerido que velem por essa herança cultural.’ ‘O Ministério da Cultura justifica esta distinção da  “Morada” pelo seu “conjunto arquitectónico de interesse histórico, arqueológico, artístico, científico e social”. Defende ainda que “o seu valor justifica a conservação, o restauro e a valorização de um conjunto de imóveis”, por isso a zona histórica será delimitada e protegida.’ ‘Com esta classificação já não será possível demolir, modificar ou alterar certos imóveis sem autorização do Município e decisão favorável do Instituto da Investigação e do Património Cultural (IIPC). É, também, estabelecida uma norma de construção que irá orientar as novas edificações e a autorização só pode ser concedida se os trabalhos ou obras estiverem em conformidade com o plano de salvaguarda e de valorização do Centro Histórico de Mindelo.’
Assim, chamo a atenção que com estas disposições a cidade do Mindelo pode habilitar-se no futuro a pedir indemnizações por todo o prejuízo cultural e patrimonial associado à destruição do seu património, para além de outros mecanismos legais que poderão ser accionados para exigir em sede própria responsabilidades criminais por acção danosa ou por inacção.
O Governo e a própria Câmara Municipal de São Vicente têm nas mãos o poder de ressuscitar o ex-cinema Eden Park, afirma o caderno cultural Kriolidadi de Novembro.  
Assim, a pergunta que se coloca ao Governo, à CMSV a ao IPCC (Instituto da Investigação e do Património Culturais) é se existe alguma disposição no sentido de implementar medidas tendentes a pôr em prática a classificação da cidade e as directivas de preservação, o que é que se espera para se tomar medidas no sentido de proteger e restaurar este património? Pois não obstante as proclamações sonantes, a sensação que se fica é que em Cabo Verde as palavras levam-nas o vento.
Mas a indignação é tanto maior com uma notícia oportuna e que caiu a pique no debate com o anúncio recente de que ‘ o Governo pretende inovar e promover a cultura cabo-verdiana fazendo-a expandir para o continente africano e gerar emprego’, ‘Cabo Verde vai apresentar e pedir financiamento dos três projectos inovadores, nomeadamente “o Banco da Cultura”, “Projecto Rede Nacional da Distribuição do Artesanato” e o “Atlantic Music Expo”.Assim, é oportuno questionar como as autoridades enquadram a cidade do Mindelo, capital decapitada da cultura, neste projecto, assim como o palácio da Cultura de S. Vicente, o Eden Park, o Fortim, etc. É motivo para questionar várias atitudes de dois pesos e duas medidas nas decisões do governo de Cabo Verde e até afirmar que afinal há dinheiros, que quando há vontade política ou os interesses partidários ou de regime estão em jogo, sabe-se muito bem ir buscar financiamentos. Assim, achamos por bem sugerir que o Eden Park, o Fortim e o Liceu, entre outros, sejam comtemplados.
A partir daqui começa o artigo publicado em 2011:
A questão do património foi-me introduzida durante a intensa luta que envolveu cidadãos mindelenses residentes e na Diáspora, travada para a salvaguarda de dois importantes patrimónios da cidade: a Casa do Dr. Adriano Duarte Silva (ADS) e o Éden Park (EdP). Nesta altura escrevi um artigo, entre vários, intitulado O PATRIMÓNIO ARQUITECTÓNICO E HISTÓRICO DO MINDELO TEM OS SEUS DIAS CONTADOS?, publicado em Novembro de 2009, em vários jornais online e em papel, em Cabo-Verde.
Volvidos cerca de 2 anos, a situação patrimonial do Mindelo piorou, pairando agora ameaças ainda mais graves sobre zonas periféricas que se estendem para além do anel periférico, Praça Estrela- Praça Nova- Fonte Doutor.
Atacam-se prédios isolados, numa lógica de provocar um efeito dominó em quarteirões inteiros da cidade e em áreas que deveriam ser classificadas. Nesta estratégia a ousadia foi muito longe, mesmo os edifícios centenários situados em zonas nobres, tais como a Praça Nova ou a Pracinha da Igreja, já começam a vacilar. Na presente situação, não se vislumbra inflexão possível às políticas urbanísticas nefastas aplicadas nestes últimos 35 anos, pois, não obstante as denúncias, persistem e acentuam-se os erros que têm levado a descaracterização da cidade.
Já em 1999, Jean Yves Loude se indignava com o  estado do património em Cabo-Verde e exprimia a sua pena em ver que o desenvolvimento em curso em Cabo Verde quase nunca se cruza com a permanência de salvaguarda do património. Blocos de betão crescem enquanto admiráveis sobrados aluem. O deficit aumenta nos dois quadros. O visitante faz careta à vista da modernidade obsoleta e deslocada dessas gaiolas e deplora o desaparecimento da arquitectura histórica que procura. À saída da Casa Figueira, do encontro do fim da tarde com os pintores Manuel Figueira e Luísa Queirós, refere do seguinte modo ao Mindelo descaracterizado, ‘A esta hora as pragas infligidas por certos arquitectos insensíveis ou incultos ao corpo glorioso do Mindelo insultam menos a vista, e as sombras das recordações felizes atrevem-se a sair.’ Referindo ao sentimento de Manuel Figueira por Mindelo escreve ‘…Em compensação trata do corpo da cidade em termos admirativos. Pinta-a com urgência, mesmo que uma composição lhe leve um ano. Quer antecipar-se aos inevitáveis ultrajes dos promotores imobiliários, tão bárbaros aqui como em outros lugares.’ Numa visita ao atelier do artista mindelense Tchalé Figueira, este desabafa ao autor sobre a situação sociocultural na ilha, numa altura em que ele próprio nem imaginaria que esta ainda não atingira o fundo:’-A cidade está à deriva, os intelectuais foram embora, aqueles que restam andam às voltas, os templos nocturnos extinguiram-se…’
Quando poucos se preocupam com o destino do património do seu país, e quem decide não tem olhos para ver ou faz ouvidos moucos, só restam alguns nacionais e estrangeiros para deplorarem a sua situação actual. 
É óbvio que esta sanha contra o património cabo-verdiano resulta em primeiro lugar da estreiteza de vista provocada pelo fecho umbilical do país, e da extrema ignorância das elites dominantes do país em relação ao valor histórico construído. É também o resultado da conivência e da cumplicidade das autoridades centrais e locais, aliadas a interesses imobiliários e privados, ávidos de ganhos imediatos.
O tema do património foi largamente debatido ao longo da intensa luta que culminou com a demolição da casa ADS e a alienação do EdP. Nesta ocasião a situação de abandono do património e da descaracterização da cidade foi denunciada por vários articulistas. A luta foi simbólica, revestia um significado político forte. Para além de destruir um património material da cidade, foi a segunda tentativa de eliminação de ADS da história. Diga-se de passagem que o próprio Presidente Pedro Pires, que proferiu um importante discurso em defesa do património cabo-verdiano no 1.º SIRUM – Seminário de Reabilitação Urbana do Mindelo, 2006, foi contra a demolição da casa. Tendo em conta esta posição emanada do mais alto magistrado do país, seria de esperar que o ex-Ministro Manuel Inocêncio e/ou o 1º Ministro arrepiassem caminho e revertessem a decisão, mas o tempo encarregou de demonstrar as razões da determinação do governo. Hoje é claro que a casa foi um alvo ideológico a abater e que os dirigentes do país não têm nível cultural suficiente para valorizar um património. Para além disso, tratava-se do fim de mandato, pelo que era importante realizar uma obra de regime, no timing certo. A casa tinha que desaparecer por causa de ADS mas também por causa de eleições. Obviamente que para quem se pretende ser o infra-estruturador de Cabo Verde, o protagonista de uma obra tão fundamental para Cabo Verde, como o Cais Acostável do Porto-Grande, não tem lugar na história. Foi assim que foi despachado da capital(,) um Director Geral insuspeito, anunciando ao longo do cortejo, que o levou directamente do Aeroporto de S. Pedro até a casa ADS, que desta vez ela seria mesmo demolida, a prova é que estaria presente um Director para a supervisão da tarefa, em nome dos supremos interesses do Estado.
O desastre que se abateu sobre a cidade do Mindelo começou alguns anos após a independência. O pontapé de saída deu-se com a demolição de um ex-libris da cidade, a Fazenda. Este imponente edifício, que desapareceu da memória dos mindelenses, que foi se calhar tido por alguns ideólogos como o símbolo do poder fiscal colonial, foi substituído de um dos maiores mamarrachos da cidade, a primeira obra que inaugura o mau gosto no urbanismo pós-independência. Seguiu-se o edifício da Câmara Municipal de S. Vicente (CMSV), adulterado com a justaposição de outro mamarracho, ‘o moderno e bonito’ anexo da CMSV. A eliminação da praia da Matiota, a única área balnear e de lazer existente na cidade e frequentada por todos os mindelenses, em proveito da Cabnave, um projecto puramente economicista, construído para ser um dos pilares económicos do novo regime, foi a confirmação de que o pior estava para vir tanto para a cidade do Mindelo como para a sua população. A descaracterização sucessiva da Praça Estrela, uma praça popular cheia de vida,com o seu pequeno comércio que animava os quarteirões envolventes da baixa da cidade, a chamada zona da Salina, e onde localizavam-se as sedes das populares equipas, o Mindelense e o Derby, acabou por destabilizar a área do ponto de vista social e económico, afastando a população desta zona.
Muitas outras referências da cidade desapareceram ou foram descaracterizadas: o Pic-Nic, o Miradouro Craveiro Lopes, o antigo edifício do Tribunal de S. Vicente, o Café Royal, a casa do Dr. Adriano Duarte Silva.  O Eden-Park e o Fortim del Rey em que pé estão?
Vou brevemente aqui enumerar um conjunto de obras em curso como amostras da situação actual da cidade.
Não contente com a demolições e as descaracterizações do passado, é a centenária Igreja da Nª Sª da Luz que é vítima de agressão, uma repetição do que aconteceu ao edifício da CMSV. No intuito de renovar a antiga sacristia, anexou-se um mamarracho à Igreja, estreitando ainda mais a via que mediava a Igreja e o Madeiral. Esta obra, no estilo do realismo socialista soviético ou norte-coreano, não só destoa do conjunto, como é uma autêntica obra-prima de ‘feiura’, que viola em volume e em altura todos os padrões de construção para aquela área nobre.
Não muito longe da Igreja da Nª Sª da Luz, na Rua da Luz, demoliu-se a bonita casa colonial onde morava o saudoso mindelense, Damatinha, e encaixou-se um vertiginoso mamarracho de 4 andares, entre duas nobres casas de estilo colonial, a Casa Serradas e a Padaria Central (antiga padaria de Niclet).
As tradicionais ruas da Moeda, Suburbana e da Luz, que possuíam casas típicas ou coloniais, não ultrapassando dois pisos, viram nascer prédios volumosos de 5 pisos. Na Rua do Coco, antesuma referência popular, ainda resiste, por pouco tempo, o bar Micá (Ilas Miranda), todo o resto foi levado pela onda. O mesmo acontece mais acima na ex-Rua João Carlos (hoje Eduardo Mondlane) onde as típicas casas operárias construídas pelos ingleses para os trabalhadores das empresas de carvão, vão-se consumindo a lume brando. Para coroar tudo, assistimos ao nascimento de um dos maiores empreendimentos de toda a cidade, um soberbo prédio 5 andares no local onde se situava a padaria de Nhontone Djudjin, em frente a Praça Dr. Regala, envolvida ainda por pequenas casinhas, as tradicionais casas operárias mindelenses.
É pois a independência o período charneira para a cidade do Mindelo, tendo os excessos revolucionários sido repercutidos no urbanismo e no planeamento da cidade. Uma geração de jovens arquitectos e engenheiros, recém-formados e inexperientes, recebeu como presente uma cidade onde o Estado se afastou, dando-lhes espaço e latitude para aplicar conceitos e teorias modernas, aprendidos nos bancos das universidades. Aquilo que poderia ser, com a independência, uma oportunidade para Mindelo, com aplicação de ideias e conceitos novos para a cidade, promovendo a renovação e o embelezamento da mesma, correspondeu a uma total derrapagem urbana. Abateram-se sistematicamente e indiscriminadamente património, casas típicas, assim como quarteirões inteiros. O desalinhamento das fachadas, para ganhar alguns metros quadrados de superfície habitável, tornou-se uma prática recorrente na construção. Violaram-se completamente o estilo e a traça da cidade, desrespeitando noções de equilíbrio e estética, que devem nortear a planificação de uma cidade, assim como parâmetros fundamentais como, volume, altura, dimensão, simetria, etc, que caracterizavam o urbanismo mindelense. Multiplicaram-se os horrores arquitectónicos e fertilizou-se o terreno para o caos urbanístico. Mindelo ficou irreconhecível, perdendo irreversivelmente o seu charme clássico. Não é somente o património do Mindelo que se delapidou, é também o conceito mesmo da cidade que foi posto em causa e a maneira de estar, única no mundo, que ela proporcionava.
A cidade do Mindelo foi planeada e traçada pelos ingleses, que lhe imprimiram um estilo arquitectónico único em Cabo Verde. Ela encerra história, embora recente. Nela viveram gentlemen e súbditos da sua Majestade, comerciantes, intelectuais, homens abastados, operários e camponeses oriundos de todas as ilhas. Eram pessoas citadinas com um conceito muito avançado de cidade, para o seu tempo: ruas largas e alinhadas, edifícios alinhados, fachadas sóbrias e bonitas. Esta é a herança legada que está sendo desbaratada actualmente. A desfiguração do Mindelo põe em causa um trunfo importante que ela detinha em Cabo Verde: cidade cosmopolita de estilo colonial, com elevadas potencialidades no plano cultural e turístico. 
Mindelo tem ainda potencialidades para se constituir num produto cultural e turístico de excelência, representando um investimento com forte potencial e valor acrescentado. ‘Small and beautifull’, os turistas ‘de qualidade’ não adoram torres, nem tão pouco procuram em Cabo Verde modernismo, mas o típico que aqui existe.
Num mundo global e em constante mutação, os responsáveis pelo urbanismo da cidade não podem ficar confinados aos horizontes da sua ilha, nem tão pouco visitar superficialmente certos países. Não se pode desenvolver o turismo de qualidade em S. Vicente, desconhecendo o conceito e o produto. É importante estudar realidades similares, aprendendo com os êxitos e erros dos outros: Canárias, Madeira e Caraíbas e Ásia. Exemplos de turismo sustentado podem ser encontrados nas pequenas cidades da França, na Itália Espanha, Portugal e no Brasil profundo, que ainda mantém a traça colonial em muitas das suas cidades. A necessidade de reciclagem contínua dos conhecimentos e de formação avançada é outro imperativo para equipas autárquicas que têm nas mãos os destinos da cidade.
O Manifesto Para um S. Vicente Melhor, subscrito cidadãos mindelenses maioritariamente na diáspora, sem qualquer filiação politico-partidária e pertencentes às mais diversas formações académicas e áreas profissionais, preocupados com a contínua degradação da situação económico-social e perda do estatuto político da ilha em que nasceram ou viveram parte significativa das suas vidas, constituiu um autêntico roteiro, com propostas concretas no plano económico e social, no plano político-cultural para reverter a ilha da situação de descalabro actual. O apelo foi directamente endereçado às entidades políticas para que se tomem medidas urgentes e eficazes no sentido da recolocação de S. Vicente no lugar que merece e já ocupou no contexto do arquipélago, a bem do desenvolvimento integral e equilibrado do país.
A Câmara Municipal e as autoridades têm a responsabilidade em preservar o património herdado e o legar em boas condições às gerações futuras. Apela-se assim à instauração de uma moratória relativamente a demolição do património, vetando obras que põem em causa a traça original do seu centro e os equilíbrios da cidade no seu todo. É urgente pensar em planos de salvaguarda, dotando a autarquia e o poder central de legislação e de organismos funcionais adequados, capazes de fiscalizar o cumprimento da lei. Por estas e outras razões, apelamos a urgente abertura do debate sobre a Regionalização para instalação na ilha de um Governo Regional com autonomia política, incluindo a financeira e administrativa. S. Vicente não pode esperar mais.
José Fortes Lopes |Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.">Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.
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- Jean Yves Loude ,Cabo Verde-Notas Atlânticas, Publicações Europa-América, Eds 1999.
- José Fortes Lopes, O Património Arquitectónico e Histórico do Mindelo Tem os Seus Dias Contados?, Expresso das Ilhas, 9/12/2009
- Manifesto Para um S. Vicente Melhor. Março de 2011.http://www.petitiononline.com/mod_perl/signed.cgi?mmscent,
- http://www.iipc.cv/index.php?option=com_content&view=article&id=152:classificacao-do-centro-historico-do-mindelo-a-patrimonio-nacional-&catid=34:noticias&Itemid=92
http://www.expressodasilhas.sapo.cv/cultura/item/40855-governo-quer-inovar-a-cultura-do-arquipelago-e-expandir-para-o-continente-para-gerar-emprego


[8332] - ASSOBIAR PARA O AR...

Jorge Spencer Lima
Por  Fretson Rocha para Rádio Morabeza/Expresso das Ilhas 
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Estamos a trabalhar numa política de avestruz: meter a cabeça no chão e fingir que está tudo bem...
O presidente da Câmara de Comércio Indústria e Serviços de Sotavento (CCISS) afirma que o ambiente de negócios em Cabo Verde é muito mau. Jorge Spencer Lima entende que a administração pública está contra as empresas e pede uma tomada de posição do governo para reverter a situação.

O dirigente da CCISS, que falava à Rádio Morabeza a propósito do debate sobre o Estado da Nação, que acontece hoje na Assembleia Nacional, considera que o governo está a dificultar a vida as empresas e não deixa o sector privado trabalhar.

“Vemos uma clara posição de uma administração pública anti-privado e anti-empresas. Em todos os lugares onde vamos só encontramos bloqueios e mais bloqueios, problemas e mais problemas”, entende o líder da CCISS.

O empresário considera que não adianta construir infra-estruturas para o progresso do país, quando existem barreiras que impedem o desenvolvimento dos negócios no arquipélago. Jorge Spencer Lima refere-se à construção de aeroportos, portos, estradas, entre outras obras.

“Todas estas infra-estruturas vão transformar-se, num futuro próximo, em ‘elefantes brancos’. Fazem-se estradas mas não há transportes a movimentarem-se. Estão a fazer aeroportos, mas as pessoas não podem viajar porque não têm dinheiro ou porque os preços são excessivamente caros e ninguém toma uma atitude. Constroem portos, mas a frota marítima está completamente destruída e o transporte interno é proibitivo”, realçou à Morabeza.

Jorge Spencer Lima alerta para a necessidade de mudança de posição urgente por parte do Governo sob pena de, como diz, caírem todos no mesmo buraco.

“Estamos a trabalhar numa política de avestruz, meter a cabeça no chão e fingir que está tudo bem, mas não está. Entrar no buraco é fácil, difícil é sair, progredir e fazer a economia funcionar”, avisa.

Por outro lado, Jorge Spencer Lima afirma que o governo está a par das dificuldades e que apenas tem recebido promessas do executivo, “que não coloca as políticas de crescimento económico na prática”.

O dirigente da Câmara de Comércio do Sotavento defende que, para melhorar o ambiente de negócios no país, o governo deve definir políticas claras e amigas das empresas e do sector privado.

N.R. - Apenas uma pequena reflexão, que nada tem a ver com o conteúdo deste artigo mas, apenas, com o "bom nome" dos avestruzes...É que, como o "Arrozcatum" já teve oportunidade de explicar, os avestruzes não enfíam as cabeças na areia numa pretensa e estúpida manobra para "ignorar" um perigo iminente como se, ao ignorá-lo, ele deixasse de existir...O avestruz é uma ave inteligente e ainda está por explicar a origem desta indigna lenda que há tanto tempo estigmatiza o pobre bicho que, quando atacado, se defende com coices das suas poderosíssimas pernas!



[8331] - CABO VERDE - A DESCOBERTA DA PÓLVORA...

A Ministra do Desenvolvimento Rural prometeu esta quarta-feira mais investimentos para a ilha de São Vicente, de modo a reforçar a sua importância agrícola no contexto nacional.

Eva Ortet
  Em declarações à imprensa, no âmbito da sua visita à ilha para o lançamento oficial das obras de mobilização de água no meio rural, Eva Ortet anunciou que o grande projecto para São Vicente já está a caminho.

“Os equipamentos que estamos a lançar representam o começo do programa de mobilização de água para São Vicente, mas o grande programa de investimento está a caminho, com o estudo de bacias hidrográficas, no processo de lançamento de concurso”, afirmou a governante.
De acordo com a tutela, “São Vicente é a terceira ilha agrícola do país”, uma posição que o governo quer reforçar, com a construção de mais infra-estruturas de mobilização e adução de água para a prática agrícola.
“São Vicente, em termos de agricultura e savoir faire, é um champion, não só em termos de produção, mas a forma de produzir. Não foi por si só que quem venceu o prémio do agronegócio era de São Vicente. A ilha está a dar o exemplo na questão das compras locais, numa parceria com a Ficase, o MDR e o Ministério da Saúde, para abastecer as cantinas escolares", sublinhou Ortet.
Outro anúncio foi a inclusão de São Vicente na segunda fase do plano do salvamento de gado implementado pelo governo.

“Terminámos a primeira fase do plano em Janeiro, São Vicente não estava incluído porque tínhamos a pressão das ilhas com mais carência. Neste momento achámos por bem alargar o plano também à ilha, tendo em conta o peso que tem a nível da pecuária”, explica.

As obras de mobilização de água agora lançadas têm um prazo de execução de cerca de dois meses e meio.

(Expresso das Ilhas)


quinta-feira, 30 de julho de 2015

[8330] - REFLEXÕES SOBRE A GLOBALIZAÇÃO...


Os Filhos da Prostituta.
O sujeito se chama Marc Faber e é norte-americano. Ele é Analista de Investimentos e empresário.  
Em junho de 2008, quando o Governo Bush estudava lançar um projeto de ajuda à economia americana, Marc Faber encerrava seu clipping mensal com um comentário bem-humorado:

 "O Governo Federal está concedendo a cada um de nós, uma bolsa de U$ 600,00." 

Se gastarmos esse dinheiro no supermercado Walt-Mart, esse dinheiro vai para a China.
 Se gastarmos com gasolina, vai para os árabes.
 Se comprarmos um computador, vai para a Índia.
 Se comprarmos frutas e vegetais, irá para o México, Honduras e Guatemala.
 Se comprarmos um bom carro, irá para a Alemanha ou Japão.
 Se comprarmos bugigangas, irá para Taiwan...
 E nenhum centavo desse dinheiro ajudará a economia americana.
 O único meio de manter esse dinheiro na América é gastá-lo com prostitutas e cerveja,  considerando que são os únicos bens ainda produzidos por aqui. 
 Estou fazendo a minha parte...
 Marc Faber

 Resposta de um brasileiro igualmente bem humorado:

Realmente a situação dos americanos parece cada vez pior.  
Lamento informar, que depois desse seu e-mail a Budweiser foi comprada pela brasileira AmBev... portanto  restaram apenas as prostitutas. 
Porém, se elas (as prostitutas) repassarem parte da verba para seus filhos, o dinheiro virá para Brasília, onde existe a maior concentração de f.d.p., do mundo.
 Abraços, 
de um brasileiro conhecedor da realidade local...

(Tks. Djibla)

  

[8329] - POEIRA DO TEMPO...



Já lá vão mais de sessenta anos, que este "m'nine de Soncente", que então estudava em Coimbra e jogava na Briosa, foi brilhar para o Inter de Milão, ao lado de outra estrela, o espanhol Gento... Hoje, o Dr. Jorge Humberto, pediatra de fama, continua a encher-nos de orgulho em terras de Macau para onde há já muitos anos se mudou de armas e bagagens...
Recordo, com saudade, os intermináveis jogos de golo-a-golo, com bola de trapos, no canalinho de João Bento, nas traseiras das nossas casas, à Rua Senador Vera-Cruz...Tínhamos, nessa altura, cerca de 10 anos de idade...Já lá vão 71, de uma amizade que resistiu à distância...Um abraço, amigo Nhunha!

(Helena Mões - José F. Lopes)

[8328] - GENTE CONCHIDE...


BLÁ...DIDAM...GUSTAVO...três m'nins de Son'cente, na temp'
que Mindel' era sabe!

(Soncente Cabo Verde - José F. Lopes)

[8327] - D E S A B A F O...


Oh, Cabo-Verde,  já não és a minha musa, és a minha tristeza, não quero ser indiferente, mas há tanta maldade e Morabeza é uma grande farsa, vejo os teus novos ricos e os seus carros feito phalos obscenos, se dinheiro fosse cultura estes pilantras seriam a biblioteca de Jorge Luis Borges, oh ilhas desafortunadas, políticos feitos jericos zurrando no parlamento, povo sem cheta e sem rumo, democracia é para sofistas, oportunistas, jornais e opiniões, e o povo lê jornais? A raposa come a galinha, o leão o veado, o povo é degolado na terra seca, as vacas comem papel, a cidade em estádio de sítio, larápios assaltam e cortam cabelos às pessoas, religião e moral é avé-maria para tolos, o inferno é aqui, há Q.I. esvaindo no asfalto das universidades, há gajos escrevendo livros, autênticos vagões de vírgulas, somos os pretos mais inteligentes, os convencidos, os africanos de primeira, lemos Camões, sabemos de métrica e o prêmio Nobel da bazofiaria vai aos ratos, nesta cloaca, nestas ilhas de MORABESTA!!!!!!!!!!!!!!!!!!

segunda-feira, 27 de julho de 2015

[8224] - ROTEIROS PARA MINDELO...

José Almada Dias
A problemática da qualificação da oferta turística nacional está na ordem do dia. Tendo integrado a equipa que elaborou o estudo “Inventário dos Recursos Turísticos” das ilhas do Norte de Cabo Verde, sei que se pretendeu ir além do habitual, apostando na elaboração de propostas de roteiros turísticos que se centrem na nossa gente e na nossa génese como povo, ao invés de nos centrarmos somente em praias e caminhadas nas montanhas (que também fazem parte, mas como complemento).

Somos o primeiro país crioulo da era moderna e não tiramos partido disso. Por aqui passou e se iniciou boa parte da história recente do mundo ocidental, pois foi aqui que começou o Novo Mundo. Temos quase 500 anos de uma história rica, que começou na Ribeira Grande de Santiago, espalhou-se pelas restantes ilhas e pelo mundo, e regressou ao Porto Grande, onde entretanto nasceu a cidade do Mindelo, povoada por cabo-verdianos livres vindos de todas as ilhas, que trouxeram com eles um bocadinho de todo o Cabo Verde. Foram esses cabo-verdianos, já cientes da sua identidade miscigenada, fruto da colisão carnal de vários povos, que se juntaram de forma cosmopolita e descomplexada aos marinheiros e viajantes de todo o mundo.

O foco da nossa oferta turística deve por isso centrar-se cada vez mais na nossa rica paisagem humana, diferente de ilha para ilha – Um País, Dez Destinos, cada ilha um pequeno mundo, cada vila e aldeia uma prova de que os seres humanos são iguais e podem viver em harmonia, cada cabo-verdiano a prova viva de que só existe uma raça, a humana, e que a cor da pele, dos olhos ou o tipo de cabelo podem coexistir numa só família, e que a mistura de culturas é o futuro.

Temos que aprender a contar a nossa História como os primeiros crioulos resultantes da expansão mundial, desta nova identidade civilizacional que antecipou a globalização e que é, ao mesmo tempo, a identidade presente e futura da Humanidade.

Enquanto não valorizarmos tudo isso, continuaremos a não perceber quem somos. Quem não sabe quem é não pode contar a outros a sua verdadeira história e muito menos lucrar com isso (espero não ser acusado de heresia por pretender “vender” a nossa história).

Esta crónica é dedicada aos roteiros turísticos alternativos para a cidade do Mindelo, essa pequena urbe baptizada inicialmente como Vila Leopoldina, e que mais tarde foi rebaptizada em honra ao desembarque das tropas liberais na praia do Mindelo em 1832, perto da cidade do Porto, de que resultou a libertação de Portugal do jugo absolutista. Mindelo é um nome que rima com liberdade em vários momentos da História lusófona.

Foi aqui neste Mindelo que se fez a primeira greve de trabalhadores cabo-verdianos há quase um século. Foi aqui que nasceu a revista Claridade, sinónimo de um despertar nacional através das letras.

Vamos então às nossas propostas de oferta turística para a cidade, a juntar às já existentes. Uma cidade que deve ser tratada como um museu, no dizer de Gualberto do Rosário, a quem também devemos a ideia do Roteiro da Água.

Museu Cesária Évora: ligado à criação de um Roteiro da Diva dos Pés Descalços, do seu invulgar trajecto de vida, das casas onde morou, da aprendizagem da música com o seu tio B. Léza, dos bares onde cantou durante décadas antes de partir de pés descalços à conquista do mundo inteiro.

Museu da Música: em homenagem a Bana, Cesária, B. Léza, Manel d’Novas, Luís Morais, Jotamonte, Frank Cavaquinho, Ti Gói, Tututa, Luís Rendall, Biús, entre outros; um museu onde deverá ser contada a introdução do meio-tom brasileiro na morna por B. Léza, a criação da coladeira como música cosmopolita resultante da vivência desta cidade-porto, onde, cerca de dez anos depois do primeiro samba ser gravado no Rio de Janeiro, B. Léza já compunha sambas em homenagem aos marinheiros que passavam na baía do Porto Grande.

Museu do Porto Grande: para contar a sua importância histórica para a economia de Cabo Verde e do mundo, o seu papel na expansão europeia para a América Latina, África Austral e outras paragens, e também na emigração cabo-verdiana.

Museu das Telecomunicações: onde deverá ser contado como o primeiro cabo submarino foi amarrado em São Vicente em 1884, ligando a Europa ao Recife, no Brasil, fazendo-se nesse mesmo ano uma ligação à ilha de Santiago e desta para o continente africano; e como as telecomunicações da Europa para a América Latina e África Austral passavam na íntegra por Cabo Verde; para lá da presença, na altura, de duas empresas concorrentes a operarem cabos submarinos, uma inglesa e outra italiana.

Museu do Carvão: o Porto Grande começou por ser um porto carvoeiro, tendo sido considerado um dos 3 mais movimentados na altura; o abastecimento de carvão era feito a partir das cidades de Newcastle e Cardiff do Reino Unido, daí as vendedeiras de carvão das ruas do Mindelo gritarem “Oli carvon Cardiff, oli carvon Nhô Cass”; para quando uma geminação do Mindelo com Cardiff e Newcastle?!
Museu do Cinema: ligado ao Éden Park, a primeira grande sala de cinema do país, e cuja recuperação deve ser um imperativo nacional assumido pelo Estado de Cabo Verde, mesmo que seja em parceria público-privada; onde deverá ser contada a história do cinema em Cabo Verde, com exemplos como Gaetano Bonucci (filho de Pietro Bonucci e de Mª da Luz Rocheteau Leça Bonucci), o primeiro realizador de cinema natural de Cabo Verde a dirigir uma longa-metragem, «A Morgadinha dos Canaviais», filmada em Portugal em 1949, e na qual participaram, entre outros, Eunice Muñoz, Ruy de Carvalho, Costinha e Maria Matos.

Museu do Carnaval: onde se poderá percorrer a história da maior festa popular do país com grupos organizados desde 1920, e o primeiro andor em 1939, e contar que antes disso o Entrudo português chegou ao Brasil através de portugueses das ilhas dos Açores, Madeira e Cabo Verde.

Museu da Literatura Cabo-Verdiana: ligado ao Roteiro dos Claridosos, devendo incluir uma sinalética das casas onde moraram os Claridosos e ainda onde residiram outros intelectuais das ilhas como José Lopes, Eugénio Tavares, Luís Loff de Vasconcelos, Amílcar Cabral, entre muitos outros.

Roteiro da Água: mostrando o desenvolvimento da cidade ligado à história da procura da água através dos nomes de vários bairros – Fonte Cónego, Fonte Francês, Fonte Filipe, Fonte Inês, Fonte Doutor –, passando pela vinda diária de água do Tarrafal de Santo Antão num navio-cisterna, e terminando no primeiro dessalinizador do país, cujo espaço na Matiota deve ser parcialmente preservado como um Museu da Água, integrado na necessária requalificação urbana dessa zona turística.

Roteiro dos Ingleses: relevando a importância das empresas carvoeiras e o seu impacto na criação da cidade, e de emprego formal para as gentes que vinham das ilhas, possibilitando a primeira transição de uma economia rural agrária para uma economia de prestação de serviços internacional, proporcionando a um tempo aos cabo-verdianos o contacto com o mundo; a arquitectura colonial das casas; a introdução dos desportos em Cabo Verde, como o futebol, ténis, cricket, golfe; do five o’clock tea, da cultura do Gin & Tonicantes do almoço e do scotch, hábitos que se espalharam para as restantes ilhas.
Roteiro dos Brasileiros: a ligação ao Brasil e ao samba e as influências musicais dos marinheiros brasileiros em B. Léza (introdução do meio-tom brasileiro na morna), nos solos de violão de Luís Rendall, nos desfiles do Carnaval, nos sambas compostos por B. Léza, Ti Gói e outros compositores, fora o como o samba foi adoptado até hoje como um género musical nacional.

Roteiro dos Italianos: a presença da ITALCABLE, empresa de telecomunicações que operava um cabo submarino que ligava a Europa ao Brasil e à Argentina, passando por S. Vicente; os vários comerciantes italianos da cidade no início do século passado; figuras como Pietro Bonucci, co-proprietário, juntamente com João Rocheteau Lessa, da primeira central eléctrica do Mindelo e responsável pela electrificação da cidade, numa concessão feita pela Câmara Municipal de São Vicente em 1925 a dois privados (actualmente gritamos contra a privatização da Electra...), e como quando havia apagões o povo gritava “oh Nhô Pedrinho, Yolanda ca ta casá”, numa referência à sua filha Yolanda, professora de muitas gerações; o compositor, escritor, poeta e pintor Sérgio Fruzoni, nascido no Mindelo em 1901, filho de pais italianos (o pai era comerciante de coral), e que compôs a morna “Um vez Soncente era sábe” (“Temp de caniquinha”) e várias outras músicas, e que escreveu poemas em crioulo.

Roteiro dos Noruegueses e dos Americanos: a ligação à pesca da baleia nos famosos whale boats que vinham para abastecer e recrutar tripulação, enchendo o Porto Grande, e tendo contribuído em parte para a emigração de cabo-verdianos para a cidade baleeira de New Bedford, na Nova Inglaterra, e também para a Noruega e restante Escandinávia; e como o norueguês e o inglês eram línguas faladas fluentemente na baía do Porto Grande; as famosas brigas nocturnas entre robustos marinheiros noruegueses e ingleses, em que a polícia local preferia não intervir.
Roteiro dos Indianos: com uma forte presença no comércio da cidade no início do século passado, ao ponto dos mais antigos ainda chamarem, por hábito, lojas indianas às actuais lojas chinesas; a ligação em 1934 à revolta do Capitão Ambrósio e à Negra Bandeira da Fome, que segundo os historiadores foi oferecida aos revoltosos famintos pelos comerciantes indianos, porque a bandeira negra era um símbolo da fome na Índia; os indianos deixaram vários descendentes na cidade.

Roteiro dos Japoneses: recordando a maciça presença de barcos de pesca japoneses nos anos 60-70 do século passado, quando fizeram do Porto Grande a sua base de operações no Atlântico, e cuja presença é lembrada em várias músicas, como a célebre coladeira “Saikô daiô” feita por Ti Gói, e como a língua japonesa era falada com fluência no Porto Grande; um desses japoneses casou-se no Mindelo, tornou-se empresário local da pesca e montou a primeira escola de karaté da cidade.

Roteiro dos Homens da Baía: em homenagem aos trabalhadores anónimos vindos das ilhas e que trabalharam arduamente no Porto Grande, nas oficinas das empresas inglesas, aos catraeiros, “rocegadores”, ship’s chandlers, comerciantes, estivadores, pescadores, cicerones, prostitutas, etc.
Roteiro dos Emigrantes: com explicitação da importância do Porto Grande na maciça emigração dos cabo-verdianos no século passado, muito deles fugidos em barcos gregos, holandeses e de outras nacionalidades, em silencioso conluio com as autoridades e funcionários das empresas inglesas.

Quando viajamos para países turísticos, ouvimos inúmeras histórias que nos são contadas de uma forma que leva a que ninguém questione se são lendas ou não. Na cidade de Bruxelas, turistas de todos os cantos do mundo acotovelam-se para tirar uma fotografia a uma pequena estátua representando uma criança nua a urinar. Segundo contam, esse menino terá urinado por cima das tropas de Napoleão aquando da invasão do país. Esta inusitada história, de credibilidade duvidosa, foi transformada num roteiro turístico obrigatório da capital da União Europeia. Vendem-se abridores de garrafas, copos, roupa e um sem número de outros artigos com o corajoso “menino mijão”, que totalizam certamente milhões de euros por ano.

O corcunda de Notre Dame continua a ganhar dinheiro para a sua cidade de Paris, séculos depois de morrer.

Nós por cá temos de ir para além do sol e praia, dos vales verdejantes e vulcões, e começar a contar as nossas estórias, que existem por todos os vales e cutelos deste pequeno país prenhe de História.

Um País, Dez Destinos, cada ilha um pequeno mundo crioulo.  (in E.I.)

[8223] - O PORTUGUÊS NA LÍNGUA INGLESA...


Nestes tempos de novas tecnologias, o nosso papiar vai engravidando de termos britânicos que, dizem, não têm tradução fácil ou utlilizável, em português...Às vezes, até parece que estamos em Londres se dois carolas desatam a falar dos seus PCs, dos "downloads", dos "back-ups", dos "links" e outros palavrões do género...
Isto até podia dar a ideia de que, afinal, a língua inglesa é auto-suficiente e até lhe sobra léxico para exportar termos, mais ou menos técnicos, para outras línguas menos "dotadas"...Mas, por acaso, isso não será bem assim, pois a língua inglêsa como, de resto, todas as linguas, foi buscar a outros falares termos que não existíam na sua língua materna e, por exemplo, ao português já vieram buscar mais de 100 palavras...
Eis, algumas delas, mais ou menos técnicas, claro...

ALBACORE - Albacora, atum branco...
AMAH - Ama, aia...
ANIL - Anil, indigo...
ASSEGAI - Azagaia, zagaia...
BANANA - Banana...
BAROQUE - Barroco...
BRINGEL - Beringela...
CACHALOT - Cachalote (baleia)...
CARAMEL - Caramelo...
CASHEW - Cajú...
CASTE - Casta (classe social)...
COBRA - Cobra, cobra-naja...
COMMANDO - Comando (militar)...
CORRAL - Curral...
CREOLE - Crioulo
FETISH - Feitiço, fetiche
JAGUAR - Jaguar, onça...
JUNK - Junco...
LAC - Laca...
MANIOC - Mandioca...
MOLASSES - Melaço...
MARMALADE - Marmelada...
PAGODA - Pagode (templo)...
PALMYRA - Palmeira...
SARGASS - Sargaço...
TANK - Tanque, cisterna...
TAPIOC - Tapioca...
TEAK - Teca (madeira)...
YAM - Inhame...
ZEBRA - Zebra...

sábado, 25 de julho de 2015

[8322] - CPLP - ANO XIX...

Terraço do Paraíso / EPAR » 25 Julho (sáb.)

No mês em que se comemoram 19 anos sobre a criação da Comunidade de Países de Língua Portuguesa, convidamos para uma tarde e noite dedicadas à riquíssima diversidade cultural do universo geocultural da Língua Portuguesa e ao muito que ainda há a fazer para que a Lusofonia, entendida na sua dimensão mais plural e de cidadania colectiva, se afirme decididamente como um instrumento de (re)encontro e de desenvolvimento dos povos e nações que nela se revêem, assente na intercooperação e no respeito recíproco pelas identidades e na soberania de todos esses países-irmãos.



No programa, a par das várias e interessantíssimas atividades previstas, apraz-nos registar a apresentação da mais recente obra de Luiz Silva, cabo-verdiano emigrado em Paris há várias décadas e membro do colectivo que editou anos a fio e com notável dedicação a publicação bilingue “Cahiers Lusophones/Cadernos Lusófonos”,  dirigida pelo já desaparecido – e sempre recordado - Daniel Lacerda.
>  
> A propósito dos “Cadernos da Terra Longe”, escreve Adriano Miranda Lima: “Embora capaz de assimilar facilmente uma cosmovisão que o habilita a enriquecer o seu espírito e a superar as suas limitações, o cabo-verdiano jamais perde a bússola da sua própria geografia mesmo que milhares de léguas o separem das suas ilhas.(…/…). Na verdade, Luiz Andrade Silva foi para a «terra longe» não para se evadir lunaticamente em busca de uma felicidade fictícia, mas para ali instalar o proscénio de uma luta tenaz a favor das comunidades emigrantes, em particular, e dos seus irmãos cabo-verdianos, em geral.”
> PROGRAMA

> 17:00 – Debate : “Cooperação e Desenvolvimento Local nos Países da CPLP”,
> Com representantes de organizações de diversos países lusófonos e das respectivas diásporas em Portugal
> 18:30 – Apresentação de livro “Crónicas da Terra Longe,” do escritor caboverdiano Luiz Silva,  com a presença do autor
> 19:30 – Poesia de autores lusófonos, dita por Delmar  Gonçalves e Filipa Vera Jardim
>  
> 20:30 – Jantar  
> Cardápio: Gastronomia de países lusófonos
> Entradas: Azeitonas temperadas (Portugal), Banana-pão frita (São Tomé)
> Pratos opcionais:
> - Bafa (Lombo de porco á moda de Timor-Leste) com Farofa Brasileira e Salada
> - Guisado de atum fresco com Xerém Tradicional (Cabo Verde)
> Sobremesa: Bolo de Ananás à moda de Angola
> Bebida: 1 bebida incluída e café
> 22:00 – Concerto:  Canções do universo lusófono, com  Filipe Santo (São Tomé e Príncipe)  e Carla Correia (Cabo Verde)
> Contribuição Solidária:
> 18   Apoios 
> Nb: Inclui acesso a todas as atividades do dia e ainda um exemplar de uma serigrafia electrónica do pintor caboverdiano António Firmino, assinada pelo autor.
>  
> Sujeito a inscrição prévia por email ou telefone até dia 24 de Julho ás 20h
> Contatos:
> E-mail: info.interculturacidade@gmail.com  |  info@epar.pt
> Telefone: 21 820 76 57  | 21 884 41 30
> Parceria: Centro InterculturaCidade /  Epar  / Etnia / Animar
> Apoio: UCCLA

quarta-feira, 22 de julho de 2015

[8320] - O PRIMEIRO VAGIDO DA REGIONALIZAÇÃO?! ...

A PROPÓSITO DO FINANCIAMENTO "REGIONAL" DO SECTOR DO TURISMO...



Leonesa Fortes explicou que, em breve, passarão a existir três centros regionais de promoção turística e captação de investimentos para o sector no país, dotados de autonomia e capacidade de decisão, e que deverão competir entre si.

Santa Maria - 22 de Julho - A Cabo Verde Investimentos e a Direcção Geral do Turismo de Cabo Verde vão assumir uma vertente regional de forma a ganhar mais proximidade e capacidade de decisão ao nível local. 

O anúncio foi feito pela ministra cabo-verdiana do Turismo, Investimentos e Desenvolvimento Empresarial, Leonesa Fortes, segundo informações adiantadas pelo site turisver.

De acordo com esta fonte, Leonesa Fortes explicou que, em breve, passarão a existir três centros regionais de promoção turística e captação de investimentos para o sector no País, dotados de autonomia e capacidade de decisão, e que deverão competir entre si. 

Um dos centros ficará instalado em Santiago, abrangendo Fogo, Brava e Maio. No Sal, ficará um segundo centro, compreendendo também a ilha da Boa Vista. E São Vicente, funcionará o terceiro centro regional, que actuará igualmente em Santo Antão e São Nicolau.

Apostas que segundo a responsável serão novos desafios: - “Estamos perante novos desafios e apresentamos novas soluções”.  (in Ocean Press)

[8319] - DESIGN...


CARCHARHINUS LEUCAS, OU TUBARÃO-TOURO, O MAIS PERFEITO DESIGN AERODINÂMICO...

[8318] - S O L I D Ã O ...


Os últimos cinco posts do Arrozcatum, registaram o recorde - negativo - de 86 visualizações e ZERO comentários..
Isto significará que a grande maioria dos nossos visitantes e os habituais comentadores está a banhos e, obviamente, deixou os PCs em casa o que, de resto, eu faria se estivesse na pele deles...Mas, como por motivos diversos e mais um, não terei "férias", no sentido lúdico do termo, resta-me tentar combater este conhecido sabor de orfandade epistolar continuando a editar textos próprios e alheios na expectativa de haja sempre alguém que os leia, mesmo que ninguém os comente antes que esfriem as águas algarvias. Só desejo - e afirmo-o com toda a sinceridade - que o silêncio em que me movo nada tenha a ver com situações de doença ou afins...
Quanto ao resto, que as férias sejam retemperadoras das forças físicas e anímicas para a sempre renovada luta por um Mundo melhor em que todos mereçam e obtenham um lugar ao Sol, mesmo que não seja o do Algarve - o da Costa da Caparica serve, perfeitamente, e o da minha varanda não é pior!

terça-feira, 21 de julho de 2015

[8317] - CABO VERDE - BANIR AS ENERGIAS FÓSSEIS...

Cabo Verde possui diversas fontes de energia não fóssil em abundância: solar, eólica, correntes marinhas (intensidade das correntes) e o sistema OTEC (usa gradientes térmicos entre as águas de fundo <10 cie="" de="" e="" superf="">20ºC).
http://homework.uoregon.edu/pub/class/162/oceans1.html
Podemos ter, também,  energia potencial, entre os pontos mais elevados e os mais baixos. Da conjugação destes factores poderá resultar uma redução significativa do consumo de combustíveis fosseis e a uma utilização generalizada da energia eléctrica quando imaginamos que, agora, queimamos petróleo (o ouro negro) para produzir água doce. Se amanhã pudermos produzir água a partir de electricidade não convencional poder-se á transformar Cabo Verde num país, efectivamente, verde. Por outro lado, uma nova tecnologia está a despontar no horizonte, a dos carros eléctricos desenvolvidos por TESLA MOTORS-USA, do sul africano Elan Musk e outras empresas do sector, embora os preços ainda sejam proibitivos... Cabo Verde poderá também apostar, num futuro mais ou menos longínquo, em 100% de carros eléctricos desde que os preços venham a ser razoáveis. A mesma empresa, TESLA MOTORS-USA, já comercializa nos USA baterias para uso doméstico, o que irá revolucionar ainda mais o mercado energético.

José Fortes Lopes

segunda-feira, 20 de julho de 2015

[8316] - POESIA DA 3ª IDADE...


"Me olhei no espelho e notei que…
quando a gente envelhece,
o cabelo embranquece,
o osso adoece,
o joelho endurece,
a vista escurece,
a memória esquece,
a gengiva aparece,
a hemorroida engrandece,
a barriga cresce,
 a pelanca desce,
o bilau amolece,
o ovo padece,
 a mulher se oferece …
…e a gente agradece."

Colabor. Djibla


[8315] - REGIONALISTAS - OS PROSCRITOS...

José Fortes Lopes
Segundo uma certa corrente de Pensamento em Cabo Verde "os defensores da Regionalização são pessoas da Diáspora bem instaladas na vida e que não têm mais nada a perder na vida"! Esta afirmação é uma infâmia, sobretudo quando pronunciada por supostos intelectuais. Isto dá uma ideia do estado de deliquescência social, política, cultura e intelectual em que está mergulhado Cabo Verde. Está subjacente a essa afirmação que quem, em Cabo Verde e na Diáspora, opine ou abrace uma causa cívica corre riscos sérios de ser proscrito para não dizer mais nada... Isto deita abaixo o manto diáfano da hipocrisia em que se vive em CV, do 'comi' e cala, senão..... Portanto, quem afirma tal enormidade denuncia uma situação social e política indigna em C. Verde: quem se engaja em movimentos cívicos é porque não tem mais nada a perder, pois enquanto tiver algo a ganhar fica confortavelmente quieto, como o fazem as pessoas que lançam estas acusações, porque cairá dos céus o Maná sem nada se pedir... Ou seja: a um cidadão que se engaja numa acção de cidadania, o sistema (O BIG BROTHER) dá cabo dele, tira-lhe a mama, tritura-o, isola-o, torna-o "persona non grata", e não terá mais futuro em C.Verde!  Estaremos pois a viver ou numa Farsa de Democracia ou numa Ditadura Democrática, o diabo que escolha... É uma condenação dos cidadãos da Diáspora que tomaram a dianteira da defesa dos direitos dos cabo-verdiano à Regionalização: ''Vocês os atrevidos da Diáspora que não sabem estar calados não têm mais futuro em Cabo Verde, nem como turistas..." Ai, meu Deus !!!!

[8314] - A RÉPLICA...

Em 18 de julho de 2015 22:28, Manuel Fernandes escreveu:
Para se conhecer a posição do Movimento para a Democracia sobre as questões que foram hoje aqui discutidas, junto anexo o discurso do Presidente Ulisses Correia hoje, 18 de Julho, em Santo Antão.
MMFernandes



Movimento para a Democracia
Exm@ Sr@ ,
partilhamos, em anexo, o discurso proferido pelo Sr. Presidente do MpD, Dr. Ulisses Correia e Silva, na Conferência Compromisso Santo Antão que teve lugar hoje, 18 de Julho, no concelho da Ribeira Grande de Santo Antão.
Melhores cumprimentos.

...oooOooo...

Muita gente deve ter recebido este convite para ler o que foi dito em Santo Antão, no dia 18, pelo dirigente de um partido, obviamente em discurso de campanha e, como é costume em tais situações e em qualquer latitude, prometendo este mundo e o outro na perspectiva de mais tarde, colher os respectivos dividendos nas urnas...Um dos nossos colaboradores habituais respondeu...

Caro senhor Fernandes.
Na parte que me cabe, agradeço o envio do discurso.
Como líder nacional do partido que representa, e nessa condição candidato a primeiro-ministro, o discurso do senhor UCS centrou-se demais na problemática particular de uma ilha, quando teria sido, talvez, mais pedagógico e politicamente mais promissor, colocar a tónica na região do noroeste, visto que ela, no seu todo, é o rosto clamoroso da clivagem criada no país pelo centralismo político e pela imparável hegemonia de Santiago/Praia.
É claro que o tónus e a intenção do discurso são em si mesmos reveladores da ideia-chave do seu partido quanto ao modelo de regionalização a implementar em CV (região-ilha). Bastas vezes tenho emitido a opinião de que a região-ilha não é a melhor solução para a exploração das possíveis virtudes de um processo de regionalização. Desde logo, porque põe as ilhas de costas viradas, inculcando-lhes a noção, quanto a mim profundamente errada e perniciosa, de que cada uma, por si só, é portadora de potencialidades e massa crítica suficientes para superar, sozinha, o  ciclo histórico do seu atraso e subdesenvolvimento. Por outro lado, subjaz a esse ponto de vista, aliás tem sido isso bem notório, que existe uma latente rivalidade entre a ilhas de S. Vicente e S. Antão, coisa que eu remeteria simplesmente para o divã do psicanalista. Pois, alguns acreditam e defendem que S. Antão deve ignorar a ilha vizinha porque pode alcançar os mesmos níveis de progresso histórico conseguidos outrora em S. Vicente. Ao invés de apostar na sua verdadeira vocação – a rural – e aí explorar todas as potencialidades, incluindo o turismo rural, não senhor, a ilha deve replicar tudo o que encontra mais e melhores condições naturais em S. Vicente – indústria, pescas, ensino, cultura, comércio.
É assim que, para alguns políticos santantonenses, o aeroporto de Cesária Évora, situado a 30 minutos por mar de S. Antão, não lhes pertence, daí que, sim senhor, têm de ter o seu próprio aeroporto, nem que os aviões que manobrem para aterrar nas duas pistas quase que se cruzem na trajectória do seu voo. Se o senhor UCS e seus correlegionários fizerem um pequeno esforço de pesquisa, rapidamente verificarão que em nenhum espaço continental do mundo existe semelhante taxa de implantação de infraestruturas do género. Dirá que é diferente o espaço contínuo continental e o espaço fragmentado arquipelágico. Mas então lhe responderei que alguém que desembarca no aeroporto de Lisboa para dirigir-se a sua casa em qualquer ponto dessa cidade, leva mais tempo no trajecto do que alguém que faz a travessia do canal para chegar a qualquer ponto de S. Antão.
Ademais, estamos a falar de países mais desenvolvidos e dotados de recursos económicos, em contraponto com ilhas de um país pobre, sem meios, e que vivem à custa da comunidade internacional. Vamos pretender emular em situações e circunstâncias bem distintas das nossas?
Vamos mas é pôr os pés no chão e permitir que a lucidez e a clarividência sejam nossas amigas e parceiras.
Pior do que os malefícios do centralismo político, é o divisionismo insensato que, inconscientemente, nos arrastará cada vez mais para a indigência. Veja-se que o endividamento público é o carrasco dos países pobres.
Com isto, quero dizer que tem de haver coragem política e amplitude de olhar para, em campanha pré-eleitoral e eleitoral, um candidato a primeiro-ministro usar a mesma coerência lógica de discurso, quer o púlpito esteja postado em S. Antão, S. Vicente, S.Nicolau, Santiago, Fogo ou outra ilha. Não o fazer, é trair a democracia no que ela tem (ou devia ter) de mais puro e genuíno nas suas virtudes, deixando que triunfem a falácia e a demagogia. E é caucionar o estado de iliteracia e infantilidade democrática que, infelizmente, persiste em largos sectores do nosso eleitorado.
Os cabo-verdianos só começarão a dar passos positivos e em progressão para o futuro, quando limparem algumas teias mentais que ainda lhes tiram a limpidez do olhar e do pensamento. Somos pobres, a natureza nos é madrasta, as nossas potencialidades estão longe da nossa lisonjeira ilusão. Só com humildade e verdadeiro esforço de união em torno do interesse colectivo, é que poderemos travar a dura batalha para torcer o destino e adoçar um pouco mais as nossas vidas. Ilusões baratas não são, com efeito, a nossa melhor conselheira.
Quanto à directriz ideológica do discurso do seu partido, não me pronuncio. Somente digo que será demasiado fantasioso pensar, ou esperar, que a iniciativa privada, ou uma política de privatizações, realize parte significativa do que ao Estado deve competir, numa terra que é, reconhecidamente, pobre e desprovida de uma sociedade civil dinâmica, criativa e virada para as preocupações de ordem social. Hoje em dia, convenço-me de que neste particular demos passos atrás em relação ao passado. As pessoas o que privilegiam é o seu interesse pessoal, o seu bem-estar, pouco viradas para a solidariedade social. Por isso, discordo quando o líder do seu partido diz que se tem de abdicar de “políticas assistencialistas” por supor que o privado é uma fonte de virtudes e nele radica a verdadeira alternativa. Quão ilusória é esta visão, quão desfocada é ela da nossa realidade social! Cabo Verde é um país que jamais em tempo algum poderá abdicar de uma política social consentânea com os seus recursos. Estes têm de consagrar sempre uma fatia adequada para acudir aos pobres, carentes e desvalidos. Creio que todos os cabo-verdianos de boa consciência comungam com esta minha opinião.
Agradeço o envio do discurso e a oportunidade que me foi consentida para dar a minha opinião.
Um abraço
Adriano Miranda Lima
  

[8313] - POEIRA DO TEMPO...




Depiction of Santiago on November 17, 1585 when it was attacked by Sir Frances Drake.

...oooOooo...

Mais uma das fotos publicadas por Nanie Lima...Esta mostra a disposição das forças em confronto quando, a 17 de Novembro de 1585, o pirata inglês com bênção de Sua Magestade Britânica, "Sir" Francis Drake, tentou ocupar a ilha de São Tiago...Seria interessante saber quem é quem, neste minucioso mapa de operações...

domingo, 19 de julho de 2015

[8312] - C A M P E Õ E S ...


PELA PRIMEIRA VEZ, PORTUGAL SAGRA-SE CAMPEÃO MUNDIAL "FIFA" EM
FUTEBOL DE PRAIA AO VENCER, HOJE, NA FINAL REALIZADA EM ESPINHO,
A EQUIPA DO TAHITI POR 5-3...


sábado, 18 de julho de 2015

[8311] - SANTO ANTÃO RECLAMA AEROPORTO...


O MpD vai lançar a debate, hoje, a ideia de se construir um aeroporto em Santo Antão para potencializar as valências turísticas e económicas daquela ilha. Mas trata-se de um assunto que divide opiniões, tanto que o antigo ministro da economia, Osvaldo Lopes da Silva, considera um “disparate” projectar aeroporto internacional para cada uma das ilhas.
O debate sobre o aeroporto acontecerá no quadro da conferência “Santo Antão – ganhar os desafios da próxima década”, durante a qual o MpD pretende receber “inputs” para perspectivar o desenvolvimento de Santo Antão. Sabe-se que gentes ligadas àquele partido defendem um aeroporto de médio porte que propicie a ida de turistas e homens de negócios a Santo Antão, sem a necessidade de desembarcar no Aeroporto “Cesária Évora”, em São Vicente,  para depois fazer a ligação via marítima.
Outros defendem mesmo um aeroporto internacional, que poderia projectar o desenvolvimento turístico e económico, à semelhança do que aconteceu com a Boa Vista, a partir da abertura de uma infra-estrutura que recebe voos internacionais.
Mas, o primeiro ministro da Economia de Cabo Verde, de 1975 a 1986, considera “um disparate a toda a linha”  cada ilha pensar num tipo de infraestrutura aeroportuária dessa dimensão. Osvaldo Lopes da Silva argumenta, no número anterior deste jornal, alusivo aos 40 anos da Independência, que os governos têm de ter a coragem de dizer “não” ao povo, assim como ter sentido para não assumir aquilo que “a economia condena”. O antigo governante prefere, nesta altura, ver Cabo Verde a apostar em ligações inter-ilhas, com barcos melhores para cargas e passageiros.
Já a autarca do Porto Novo, Rosa Rocha (PAICV), defende que Santo Antão, para já, não precisa de um aeroporto internacional, mas sim de um aeródromo que permita a ligação rápida da ilha com as outras regiões turísticas de Cabo Verde, nomeadamente, Sal e Boa Vista. Em declaração à Inforpress, a edil não deixa de reconhecer, ainda assim, que uma infraestrutura aeroportuária, mesmo de pequena dimensão nessa fase em que os recursos não abundam, ajudaria a “Ilha das Montanhas” a dar um salto no seu desenvolvimento.
Existem argumentos prós e contra de vários quadrantes. O certo é que, desde 2010, o Governo anunciou um estudo preliminar sobre a construção de um novo aeroporto para Santo Antão, no quadro de um debate feito a partir da década de 1990, quando o aeródromo da Ponta do Sol deixou de receber voos de aviões comerciais. O estudo viria a apontar a zona entre Casa de Meio e Ponte Sul, a sete quilómetros da cidade do Porto Novo, como possível localização dessa infra-estrutura. E agora o assunto deve entrar em pauta no ciclo eleitoral de 2016.
Ensino superior também
Outro assunto que o MpD deve levar a debate é a abertura ou não de institutos ou escolas de Ensino Superior em Santo Antão. Este dossiê também divide opiniões, na medida em que há o argumento de que o Ensino Superior voltado para a agricultura, agro-indústria e outras áreas afins poderia propiciar o desenvolvimento da ilha. Mas há quem se mostre contra a dispersão de estruturas universitárias a todos os contos do país porque a qualidade sairia a perder.
Seja como for, o MpD convidou um conjunto de personalidades ligadas a Santo Antão para projectar o desenvolvimento da ilha, no horizonte 2016 a 2020. O presidente do partido, Ulisses Correia e Silva, vai a Ribeira Grande dar o mote ao debate, que passa por diagnóstico, visão, desafios e prioridades que o MpD projecta para a próxima década. Depois entrarão em cena conferencistas como o edil da Ribeira Grande, Orlando Delgado, Jorge Santos, Felismina Reis, Leão Lopes,  João Chantre, Albertina Pinto (Santantão Art Resort) e  Valdemiro  “Vlú” Ferreira.
O debate a ser promovido em Santo Antão, hoje, enquadra-se no ciclo “Cabo Verde UP”, que constitui uma “plataforma criada pelo MpD para promover o diálogo com a sociedade civil, no país e na diáspora e com os especialistas de todo o mundo, seja utilizando as novas tecnologias de comunicação e informação, seja promovendo os canais presenciais e directos”.

[8310] - OFERECER O PEITO ÁS BALAS...

Meu testemunho na Conferência Internacional pelo 40º Aniversário da Independência de Cabo Verde na Fundação Calouste Gulbenkian

Raras vezes falo da acção da delegação que se deslocou à Suécia para a discussão de um projecto de Saúde Materno-Infantl e de Planeamento Familiar (PMI/PF) proposto por esse país na sequência da visita de uma missão sueca a S. Vicente. Aproveitei a ocasião para o fazer até porque pouca gente conhece o assunto e os tempos são diferentes no capítulo da motivação patriótica, da ética e da valorização dos quadros nacionais não enfeudados a partidos políticos.
O Ministério da Saúde recebeu uma proposta de financiamento de um projecto de PMI/PF, após a visita de dois técnicos de uma ONG sueca chamada Radda Barnen (RB) e da SIDA (departamento de cooperação internacional sueca), que tiveram uma longa conversa comigo em S. Vicente, com convite à deslocação à Suécia de uma delegação nossa. Esta foi constituída por mim, como chefe de delegação, Dr. Pedro do Rosário, duas assistentes sociais, Dory Silveira Pires e Fátima Neves Ramos, mais uma enfermeira parteira, Tutu Évora.
Eu e o Dr. Pedro do Rosário tivemos várias sessões de trabalho em Cabo Verde, sozinhos e com elementos dos Assuntos Sociais, na perspectiva de elaborarmos uma alternativa à proposta sueca em função da nossa disponibilidade em pessoal e instalações, até porque em 1976 pouco se sabia de saúde materno-infantil e planeamento familiar por ainda nem se ter estabelecido a Estratégia dos Cuidados Primários de Saúde da OMS e de Saúde para Todos no Ano 2.000, elaborada em Alma Ata, em 1978; Portugal, que poderia fornecer-nos algo sobre a matéria, vivia em turbulência política e ainda balbuciava na matéria, nem sendo fácil, nem bem visto o contacto por nos termos libertado do seu jugo colonial havia pouco tempo, e o escritório da OMS era na Guiné-Bissau. Tínhamos uma mini experiência na matéria, o Dr. Rosário, no Centro Social da Bela Vista, com grávidas e no planeamento familiar, e eu, no Dispensário, onde, à tarde, fazia vacinações em massa, aproveitando vacinas ofertadas pela UNICEF, e controlo nutricional de crianças com menos de sete anos utilizando o sistema da fita braquial a cores.
A delegação chegou à Suécia em Fevereiro de 1977, num inverno dos mais rigorosos de que se tinha memória, eu e o colega quase de terno de algodão e gabardina para suportar tamanho frio. As senhoras iam mais bem prevenidas porque, em ocasiões próprias, botavam os seus boubous rendados que despertavam grande curiosidade e interesse visto não serem frequentes nessas paragens na época. Felizmente, ficámos bem instalados, raramente com tempo livre para passeatas ao ar livre polar.
O trabalho foi duro, com horário militar, um calendário minucioso e apertado, e eu, a maior vítima, por ser chefe da delegação, mais vezes abordado em almoços e jantares, em que, enquadrado de ambos os lados por colegas suecos, mal tinha oportunidade para levar uma garfada à boca, porque estes se arrevesavam a fazer-me perguntas (a maior parte das vezes já feitas antes por outros para testarem a nossa sinceridade). Perdi peso durante esses quinze dias por mal poder comer, dada a minha responsabilidade e pelas preocupações que povoavam a minha mente. O colega Pedro do Rosário safava-se melhor porque, como fala pelos cotovelos e utilizava, sem complexos, o francês aportuguesado, desbaratou quem quis fazer-lhe perguntas à mesa; lembro-me de o ouvir falar da nossa riqueza em lagostas, moreias, perceves, lapas e cracas, tendo até tido a impertinência de me perguntar como se dizia perceves em francês. 
Tínhamos reuniões durante todo o dia e, à noite, a delegação reunia-se no hotel para apreciar o avanço das discussões e preparar-se para o dia seguinte, por vezes com a ajuda de um dos técnicos em planeamento familiar, Dr. Halkjaer, e de uma enfermeira, Harriet Birkham, que veio depois para Cabo Verde ajudar-nos na preparação do pessoal e se radicou no país, depois da aposentação, o mesmo acontecendo ao administrador, Per Tamm, dois elementos-chave do projecto. Nas poucas horas livres levavam-nos a visitar serviços e alguns professores, conselheiros e altos funcionários da RB e SIDA que, posteriormente, nos visitaram em Cabo Verde.
Nas nossas discussões diárias a nível da RB, o trabalho ia progredindo lentamente devido às exigências e desconfianças da parte sueca e à dificuldade de comunicação – em francês e inglês – o que nem sempre era fácil para discutir matéria que exigia certa habilidade e argúcia na argumentação, que transmitissem a nossa capacidade de pôr de pé um tal projecto, e a real medida do nosso empenhamento, determinação e disponibilidade em aceitar sacrifícios em benefício do país. Outrossim, os parâmetros suecos não se adaptavam ao que pensávamos criar em Cabo Verde; teríamos de fazer bastantes adaptações: inventámos nova categoria de pessoal – ajudantes de enfermeira e de assistente social, que seriam treinadas em relativamente pouco tempo em tarefas específicas e limitadas (que vieram manifestar-se excelentes executantes nas suas tarefas, desempenhando, às vezes, melhor as funções do que técnicos do ramo), para ultrapassar a falta de pessoal de enfermagem e assistência social de que padecíamos no início da independência, e ainda de encarregados do depósito de equipamento, medicamentos e instrumentos, administrador homólogo, chefe de secretaria, arquivista e dactilógrafo. Nessa altura o país não dispunha de nenhum plano e programa de saúde, mas tínhamos um documento de estratégia nacional que era meio caminho andado, mais do que uma simples estratégia, por conter alguns elementos do futuro programa, que defendemos com unhas e dentes.
Nessa altura não sabíamos que a RB tinha cerca de dezena e meia de projectos do mesmo tipo em vários países do Terceiro Mundo que não caminhavam lá muito bem devido à corrupção e desinteresse dos nacionais, estes mais motivados em actividades clínicas rendosas, vencimentos chorudos e sem sentimentos de pertença a uma pátria. À posteriori, pensei que a RB andou, muito provavelmente, a testar-nos para se certificar se seríamos capazes de levar a bom termo o empreendimento, dadas as infelizes experiências anteriores. Mantivemo-nos firmes nas nossas convicções e idealismo que eram imensos. Não tínhamos nada a ver com os hábitos corruptivos de nacionais de outros países. Queríamos, realmente, era obter meios para pôr em prática o que idealizávamos para o nosso país e nem pensávamos propriamente em nós próprios, nas nossas famílias ou em privilégios pessoais. Vivíamos o início da independência e todos os sacrifícios eram consentidos em benefício do Estado nascente. Esguichávamos entusiasmo e patriotismo por todos os poros, como a maioria dos cabo-verdianos que viviam a aventura da independência. De resto, desconhecíamos até o que era corrupção a nível do Estado, e o que se passava nesse capítulo noutros países subdesenvolvidos. Cabo Verde foi um exemplo quase impar em África em termos de nacionalismo puro, não chauvinista - aquele sentimento íntimo de pertença a uma pátria –, de honestidade e utilização correcta e criteriosa dos dinheiros do Estado. Só me apercebi do grau de corrupção de certos países africanos quando trabalhei no quadro da OMS, porque antes não acreditava no que se dizia: achava que eram calúnias dos colonialistas para desacreditar os dirigentes dos países do Terceiro Mundo. Outrossim, corrupção não é apanágio nem invenção do Terceiro Mundo. Foi ensinada e levada para as nossas terras pelos do Norte, corrupção graúda, como vem sendo descoberta nos nossos dias, praticada a nível elevado, de governos, megas companhias, empresas públicas e bancos.
Ao longo das discussões fomo-nos dando conta de que havia cautelas demasiadas da parte da equipe sueca, lentidão na progressão dos trabalhos e pontos controversos, como o não financiamento de construções, propostas de pagamento do nosso pessoal à tabela sueca, aquisição de contraceptivos e vacinas. Nesse impasse, sugeri que se encontrasse um intérprete para que pudesse exprimir adequadamente o que tínhamos para lhes contrapor. O tradutor foi o condutor do carro que nos transportava, ex-estudante português, que dominava o sueco, e fugira do país para não ser mobilizado para a guerra colonial. Então, inspirado, com calor e convicção, dando a real dimensão do nosso empenhamento, desprendimento argêntico e patriotismo, realçando a integridade moral e ética dos nossos governantes saídos de uma renhida luta armada, pude explicar-lhes melhor e convincentemente o que nos animava nessa aventura do projecto. Não queríamos nada para nós, nenhum privilégio pessoal. Rejeitámos vencimentos à tabela sueca porque continuaríamos a ser pagos pelo orçamento do Ministério da Saúde. As únicas pessoas a receberem salário dos fundos do projecto seriam as categorias novas criadas, não previstas no orçamento do nosso ministério. Este iria integrando, anualmente, uma boa percentagem das despesas no seu orçamento de modo a que, ao cabo do tempo previsto do projecto (cinco anos), a totalidade das despesas já estivesse a ser suportada pelo orçamento do ministério. Procuraríamos maneira de as vacinas e os contraceptivos nos serem fornecidos por outras instituições, pensando na UNICEF, OMS e FNUAP, o que veio a acontecer, de modo a que houvesse poupança, a qual, sugeríamos, pudesse ser utilizada nas construções, dado que sabíamos que o Estado iria ceder-nos todas as instalações disponíveis, mas que, em certos locais, haveria que construir por falta de disponibilidade. Como esse dinheiro constava do orçamento do projecto proposto, pedíamos que assim continuasse para essa eventual utilização.
Enquanto ouvia o tradutor durante as pausas, ia apreciando as reacções das pessoas em redor da grande mesa de trabalho, e apercebia-me de que as minhas palavras estavam tendo bom efeito, e até observava um certo espanto e satisfação nos rostos dos presentes. O certo é que foi a nossa última reunião. Tínhamos conseguido convencê-los da veracidade da nossa argumentação.
Apresentaram-nos, como última exigência, que fosse eu o director do projecto de PMI/PF, o que, embora dependesse do Ministério da Saúde, julgava ser viável e altamente provável dada a minha experiência e especializações (Pediatria, Saúde Pública e Medicina Tropical). Perguntaram-me como iria sentir-me na pele de director de um projecto de tamanha responsabilidade. A resposta foi imediata: como um general de Napoleão que, ao aproximar-se do cavalo para uma batalha decisiva, reparando que lhe tremiam as pernas, dissera às mesmas: mais tremeriam se soubessem para onde vos quero levar. Sorriram com a minha tirada. Presumo que acreditaram em mim pela convicção que punha nas palavras, não desmentida pela atitude dos colegas da delegação, até porque as decisões eram tomadas por consenso.
Vim a saber mais tarde, que era o primeiro projecto da RB com director nacional, portanto, não sueco. Regressámos, não com os prometidos seis milhões e meio de coroas suecas, mas com onze milhões e meio. Não nos garantiram fundos suplementares nem nos deram autorização para utilizar as poupanças em construções. Limitaram-se a sorrir quando fizemos a proposta e deixaram essas verbas orçamentadas.
O nosso tradutor português, de nome Vidal, que já era um amigo, confessou-nos depois que a minha argumentação tinha sido convincente e decisiva, mormente quando abrimos mãos de regalias e privilégios pessoais em benefício do país e manifestámos confiança nos nossos dirigentes, a maioria antigos companheiros de escola. Estavam habituados a comportamentos bem diferentes de outras delegações, como vim a constatar mais tarde durante umas férias que me foram oferecidas, mais a minha mulher, pela RB, na Suécia, como prémio pela excelência do trabalho desenvolvido.
Foram quinze dias de trabalho insano! Sentimo-nos aliviados e felizes ao apanhar-nos no avião de regresso. Não tínhamos tido nenhum dia de sol e suspirámos de contentamento quando, depois de atravessar espessas nuvens cinzentas, vimos o Sol. Pareceu-nos ter chegado a casa. 
No primeiro ano do projecto tivemos inúmeras visitas de funcionários da RB/SIDA e jornalistas, muito provavelmente em missão de inspecção e controlos. Todos tiveram uma refeição em minha casa, em ambiente familiar, em representação do país, à minha custa. Somente ao fim de um ano é que tive de solicitar um fundo ao M. da Saúde para tais representações, por o meu vencimento, em dose homeopática, já não suportar tais rombos. Ao cabo do primeiro ano de execução do projecto tínhamos poupado cerca de vinte mil dólares do orçamento do projecto, que, na altura, era muito dinheiro. Pedi-lhes autorização para os utilizar na adaptação do Centro Social da Bela Vista às necessidades do projecto. Como já se tinham convencido da nossa integridade moral, capacidade de trabalho e de nossas iniciativas, diminuíram as visitas da sede e deram-nos carta-branca para as construções, tanto em S. Vicente como noutras ilhas, aumentando até, mais tarde, o orçamento para permitir as grandes construções na Praia e Santa Catarina. Foram realmente inexcedíveis na vontade de nos proporcionar os melhores meios para o trabalho, pelo que ficámos eternamente gratos à RB/SIDA.
O projecto levou dez anos a estender-se a todo o país e a integrar-se no M. da Saúde. Da minha experiência em África e do que pude saber através da OMS, foi o único projecto africano bem-sucedido e com integração financeira total no ministério da saúde como programa nacional. Foi considerado programa exemplar pela OMS, e modelo pela Rb/SIDA, onde faziam estágio alguns nacionais de países africanos antes de iniciarem projectos similares.
Antecipámo-nos à OMS na criação e execução dos Cuidados Primários de Saúde (CPS) inventando a PMI/PF, na qual incluímos, além da saúde materno-infantil e planeamento familiar, as Vacinações, Nutrição, Educação Sanitária e Medicamentos Essenciais. À semelhança do Senhor Jourdan da peça de Molière fazíamos os CPS sem o saber, e ainda introduzimos a rehidratação oral com sais (citrato de sódio) e glucose antes da existência do Oralite (SRO) da OMS/UNICEF, de uma experiência brasileira de que tinha conhecimento.
Este é um exemplo do que pode o patriotismo e o que se consegue realizar com honestidade e espírito de sacrifício. Obviamente que vencimento à bitola sueca cair-nos-ia maravilhosamente bem porque o pago pelo nosso Estado era minguadíssimo, dando quase só para manter o metabolismo de base. Embora acumulando três especialidades, ganhava tanto quanto um médico de 1ªclasse – que já era antes – e estava impossibilitado de fazer clínica privada por se ter socializado, não a Saúde, mas os médicos após a independência (os médicos com barbitche e as outras profissões em pastoreio livre, como escrevi em artigo publicado em 1988). Todavia, nessa altura, seriam bem poucos os que pensavam nos seus interesses pessoais e familiares. Fizemos multiplicar os pães em benefício do país e da população sem esperar, nem exigir para nós nenhuma côdea desse suculento pão. Nada disso encontrei noutros países onde trabalhei a partir de 1986 no quadro da OMS. 
Embora tenha continuado com vencimento pago pelo Estado, excluindo os dois últimos anos em que dirigi o projecto, em que tive um bónus mensal de dezassete mil escudos, fiquei, como paga nacional, com a fama de ter mamado em teta sueca durante os nove anos de direcção nacional do projecto.
A Radda Barnen e a Sida retiraram-se, satisfeitas, do projecto após a sua integração como programa Nacional no M. da Saúde, mas não do país, dado que o reliquat dos fundos do projecto e mais outro financiamento foram concedidos ao M. da Saúde para a construção e equipamento de oficinas e salas de aulas de outra obra de grande interesse social, o Centro Juvenil Nhô Djunga, no Mindelo, com capacidade para 250 alunos (dois terços internos), dedicado à formação técnico-profissional e reabilitação das chamadas crianças da rua, com uma secção para a recuperação nutricional de crianças malnutridas e educação de mães, infelizmente muito mal aproveitado, porque se o fosse, deixariam de existir crianças da rua no Mindelo.

Lisboa, 11 de Julho de 2015                                                               Arsénio Fermino de Pina

Nota:  Dispondo somente de dez minutos para a apresentação deste texto na Conferência Internacional, tive de dar saltos verdadeiramente olímpicos na leitura para transmitir algo da nossa missão na Suécia.